Uma enorme rachadura nas falésias provocada pela enxurrada após as chuvas ameaça partir Canoa Quebrada ao meio, separando o centro da Vila do Estevão. Há quem diga que esse é um antigo desejo de pessoas que gostariam de se “emancipar” e agora a natureza estaria fazendo o trabalho. Mas na realidade a chuva não é a principal responsável pelo desastre ambiental e sim a falta de infra-estrutura adequada e planejamento de longo prazo. Para piorar o quadro a lentidão de órgãos públicos faz com que a cada precipitação mais partes da falésia sejam carregadas para o mar, sem chance de serem recuperadas. Histórico: No ano 2003 foi concluído o projeto de urbanização de Canoa Quebrada. Foi escolhida uma área para captar as águas pluviais e filtrá-las na areia, abastecendo o lençol freático de água potável. No local situado entre a igreja católica e a comunidade do Estevão estão alguns dos poços que abastecem Canoa. O espaço é o único apto para este fundamental serviço ambiental, e não é por casualidade, está sendo preservado há mais de vinte e cinco anos a ferro e fogo da sanha especulativa imobiliária pela Associação dos Moradores do Estevão. Então parte da chuva foi canalizada para ali sem preparar devidamente o local e, principalmente, sem escoar o excedente de água através de drenagem.
Luciano Guimarães, arquiteto responsável pelo Projeto, alega que a estrutura de drenagem não foi executada porque implicaria cortar as falésias, e isso ficou fora de cogitação. No entanto a enxurrada não se comove com argumentos e agora a enorme fenda causa um sério transtorno e pode a se tornar um desastre ainda maior se não forem tomadas providências urgentes. Inclusive vários outros locais estão sofrendo erosão, sendo o calçamento no Estevão, também sem drenagem, apenas mais um deles. E Agora?
Sem monitoramento oficial sobre a obra, os membros da comunidade alertaram as autoridades municipais em 2007, ocasião do primeiro deslizamento de maiores proporções. Algumas medidas paliativas foram realizadas, mas o problema continuou e se agravou. Cientes que uma solução definitiva só será possível se a comunidade organizada estiver na frente, lideranças se mobilizaram e contataram políticos e autoridades dos órgãos ambientais, além do responsável técnico pelo projeto e membros da Universidade Federal do Ceará – UFC. Após reuniões foi delineado um plano de ação de curto, médio e longo prazo.
A Prefeitura de Aracati elaborou um decreto já em vigor que torna o local uma “área de risco”, solicitando ao Ibama e Semace autorização para realizar uma intervenção urgente preparando a superfície para receber mais água e cobrir parte do buraco por onde passa a estrada e a tubulação hidráulica que foi danificada. Ao mesmo tempo membros da UFC e técnicos vão elaborar uma proposta para ser encaminhada ao senador Rodrigo Rollemberg (DF) que se prontificou a buscar recursos junto ao Governo Federal e repassá-los a UFC. A Universidade terá a missão de preparar o Projeto de engenharia, desta vez incluindo obras de drenagem. As Duas Fendas
Pouco adianta consertar o efeito e não tratar a causa. Assim estaremos sempre correndo atrás do prejuízo. E a principal causa tanto da fenda na falésia como de outros problemas é a atividade predatória do homem, que constrói desordenadamente e sem fiscalização, modificando estruturas naturais milenares. Há uma fenda mental aberta na Gestão Publica Municipal de Aracati que dá a nítida impressão de ter parado no tempo, a exemplo da APA de Canoa Quebrada que não sai do lugar. Há uma rachadura na cabeça de cidadãos que não se importam com o local onde vivem e jogam lixo em qualquer local. O individualismo levado ao extremo e pouco ou nenhum espírito publico. Precisamos curar as duas fendas, a física e a mental. Para cuidar desta última o Conselho Comunitário de Canoa formou um Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento da Consciência que está trabalhando em parceria com a UFC através do Lesc – Laboratório de Estudo sobre a Consciência. O intuito é desenvolver um projeto de médio e longo prazo que amplie a conscientização individual e coletiva da população, fechando a rachadura por onde está se esvaindo o futuro da comunidade. Se nos perguntarmos qual é o destino que buscamos, como é o local no qual queremos viver e que temos que fazer para alcançar esses objetivos, venceremos a apatia e o desânimo.